terça-feira, 28 de setembro de 2010

Venezuela

ANÁLISE VENEZUELA

Maioria simples não é sinal direto de vitória

Resultados confirmam tendência de queda na popularidade de Chávez e apontam para situação difícil em 2012

LUIS VICENTE LEÓN
ESPECIAL PARA A FOLHA

Em um país convencional, a vitória em um pleito legislativo é determinada pela obtenção de uma maioria simples, isto é, mais de 50% dos assentos. No caso venezuelano, não é assim tão simples.
Nos preparativos para essa eleição, a "revolução" redefiniu a lei eleitoral, ampliando as distorções de representação em favor de zonas menos povoadas e alterando os limites dos distritos eleitorais, tomando por base o perfil histórico do voto chavista.
Isso resultou em uma distorção concretizada domingo, quando os partidários de Hugo Chávez conquistaram cerca de 50% dos votos mas ainda assim receberam mais de 60% dos assentos.
Em poucas palavras, Chávez chegou ao pleito conferindo a si mesmo uma vantagem de 30 cadeiras sobre seus adversários, caso o número de votos recebidos pelos dois grupos fosse o mesmo. A pergunta, portanto, passa a ser: ele deve ser considerado vitorioso ao obter uma maioria simples?
Obviamente trata-se de um triunfo que ele pode explorar politicamente -"somos a maioria no Parlamento"-, mas o discurso pós-eleitoral não ostentará mais o esplendor do passado. Talvez por isso o presidente tenha cancelado sua típica comemoração no Balcón del Pueblo, na noite da eleição.
Chávez fez da votação um plebiscito. O desafio que ele propôs: "Conquistar dois terços da Assembleia será a dimensão de nosso triunfo".
Mas a oposição, até agora desprovida de influência, conquistou uma posição relevante ao impedir o governo de obter a maioria qualificada (66%), o que força Chávez a negociar para aprovar leis, governar por decreto ou convocar uma Constituinte.
Portanto, a notícia relevante seria a de que ele manteve a maioria simples ou a de que perdeu seu controle férreo sobre o Legislativo?
O mais importante é que Chávez terminou próximo dos adversários ou derrotado, se computado o voto nacional total (o fato de os resultados totais ainda não terem sido divulgados oficialmente tem importância estratégica). O presidente poderá continuar ignorando essa metade do país?
Parece que não. O resultado serviu para confirmar o que as pesquisas vinham mostrando nos últimos anos: uma séria tendência de queda em sua popularidade, que o conduziu dos 75% de 2004 a 47% hoje. É óbvio que continua sendo um líder forte, o que impressiona depois de 11 anos, mas já não está na sua zona de conforto e parece possível derrotá-lo nas eleições presidenciais de 2012.
O que veremos agora será a segunda rodada dessa disputa: marketing político para vender como sucesso revolucionário a maioria simples, aprovação de leis e poderes especiais que o blindem no futuro (antes que o novo Congresso tome posse em janeiro) e uma reengenharia na estratégia de conexão com o povo. Isso o encaminhará a um dos dois extremos: moderação com aumento de gastos públicos ou radicalização maior da revolução e um conflito previsível com os setores políticos e econômicos cujo poder tentará confiscar.
Mas só saberemos o que virá quando Chávez escolher que caminho lhe convém.


LUIS VICENTE LEÓN é sócio-diretor do instituto Datanálisis

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Publicado no jornal Folha de S. Paulo em 28 de setembro de 2010.

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