segunda-feira, 14 de junho de 2010

Separatistas vencem e Bélgica dá passo para extinção

ANDREI NETTO - Agência Estado

O partido separatista de direita Nova Aliança Flamenga (NVA) foi o grande vencedor das eleições parlamentares realizadas hoje, na Bélgica. Liderado por Bart de Wever, político que defende a "evolução" do país rumo ao seu desaparecimento, o partido obteve 29% dos votos em Flandres, região de cultura holandesa, tornando-se uma das três grandes forças políticas que dividem o poder belga. Apesar da votação histórica da NVA, o líder do Partido Socialista, Elio di Rupo, que somou mais de 30% dos votos na Valônia, região de influência francesa, deve ser escolhido como novo premiê nesta semana.

O resultado favorável aos separatistas não se limitou o escore inédito do NVA. Dois outros partidos radicais de direita, o Vlaams Belang e o partido populista Lijst, de Jean-Marie Dedecker, também contribuíram para o resultado. Na soma dos votos, as diferentes matizes separatistas obtiveram 45% dos votos, tornando concreta a hipótese de aumento da autonomia de Flandres e da Valônia, e, em um futuro ainda imprevisível, a divisão do país.

Do lado valão, enquanto os socialistas de di Rupo saíram vencedores e a extrema-esquerda progrediu, o Movimento Reformador, partido de centro-direita liberal liderado pelo ex-primeiro-ministro Didier Reynders, que há três anos havia vencido as eleições na região de língua francesa, foi o grande derrotado.

Até o momento, ainda não é conhecido o resultado na terceira região da Bélgica, Bruxelas, que pode servir como fiel da balança na formação de um futuro governo. A tendência era de que Di Rupo, cujo partido sairá das urnas com uma pequena maioria dos votos, torne-se o primeiro premiê francófono da Bélgica desde 1963. Mesmo que a escolha se confirme, a expectativa é de que a ascensão do NVA obrigue os socialistas a ampliar a autonomia de Flandres e da Valônia.

Di Rupo reconheceu o novo status político de De Wever. "Uma grande parte da população flamenga deseja claramente que nosso país evolua no plano institucional", afirmou. "O PS sempre esteve pronto a uma reforma do Estado."

No mesmo tom, De Wever pregou transformações institucionais e reafirmou desejar, no futuro, a divisão da Bélgica em dois países. "Nós sempre falamos em uma evolução, de um país que divide em duas democracias. Nós devemos adaptar o país a esta realidade que já existe".


Leopoldo, o primeiro rei de uma nação abstrata

A história de como um principe alemão à beira da bancarrota tornou-se um dos homens mais ricos da Europa

A criação da Bélgica é a história da aventura de um homem: Leopoldo de Saxe-Coburgo, um príncipe alemão falido que caiu nas graças da nobreza britânica e tornou-se rei dos belgas. A epopeia do jovem "Poldi" começa quando Napoleão vence a Batalha de Iena, em 1806, e submete os Estados germânicos. Endividada, a família Saxe-Coburgo decide lutar ao lado da França.

Em Paris, Leopoldo fez de tudo para bajular Napoleão. Jamais obteve uma reunião com o imperador, mas conseguiu encontros privados com Josefina Bonaparte, que logo chegaram aos ouvidos dos bonapartistas. Mais tarde, em seu exílio na ilha de Santa Helena, o imperador se lembraria de Poldi como "o homem mais bonito que já passou pelas Tulherias". A fama com as mulheres espalhou-se e Leopoldo aproveitou-se dela.

O Congresso de Viena, em 1814, marcou o fim do período napoleônico e o início de uma onda de restauração monárquica na Europa. Para evitar novos arroubos franceses no continente, o chanceler austríaco, Klemens von Metternich, defendeu a criação de Estados-tampão entorno da França.

Uma Holanda forte, unida à Flandres, era uma ideia brilhante. Só havia um problema: o príncipe holandês, Guilherme de Orange, estava prometido a Charlotte, herdeira do trono britânico. A possibilidade de união dinástica entre Holanda e Grã-Bretanha tirava o sono de austríacos, prussianos e russos.

Para o plano dar certo, era preciso acabar com o romance entre Guilherme e Charlotte. Foi então que o czar Alexander Romanov resolveu apresentar sua arma secreta: Leopoldo.

Charlotte não resistiu às investidas do alemão e, em pouco tempo, trocou de noivo. Poldi adquiriu cidadania britânica, ganhou patente de marechal do Exército real e condecorações de todo o continente.

Charlotte morreu em 1817, antes de dar à luz o herdeiro do trono. Para Leopoldo, deixou uma polpuda pensão que lhe permitiria vadiar pelo restante da vida. Poldi, no entanto, resolveu dar pitacos na política britânica e tornou-se um dos homens mais influentes da Grã-Bretanha.

Revolução. Quando a onda revolucionária de 1830 derrubou a dinastia francesa e instaurou a Monarquia de Julho, Bruxelas recebeu um grande fluxo de revolucionários vindos de Paris. Eles chegaram dispostos a lutar pela separação do sul da Holanda e sua anexação à França.

Para a Grã-Bretanha, uma concessão territorial aos franceses estava fora de questão. Em 1828, Londres havia mediado o fim da Guerra da Cisplatina, entre Brasil e Argentina, e a criação de um Estado-tampão, o Uruguai. A experiência foi a base da invenção do Estado belga, três anos depois. Para o trono vago, candidatou-se Leopoldo. Com a aprovação dos aliados britânicos, ele se tornou Leopoldo I, rei de uma abstração chamada Bélgica.

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Publicado no jornal O Estado de S. Paulo em 13 de junho de 2010.

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